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Phase X - Yellowstone, Wyoming

Nosso primeiro dia no Wyoming seguindo uma estrada reta, de Gillette a Buffalo, e depois as montanhas até Cody. Marcado pelo primeiro problema com Gilda: superaquecimento. Na verdade, quando chegamos a Buffalo (onde paravam os rebanhos antes de serem levados para Chicago, aparece em qualquer livro de cowboy), tivemos que colocar um pouco de óleo, água e gasolina. Não sei se o óleo foi demais, se a gasolina era muito vagabunda ou o quê, o fato é que na primeira subida, Gilda superaqueceu e tivemos que parar. E depois não queria pegar. Eu já queria chamar o AAA (Automobile Association of America). Mas como, se naquela estrada não passava ninguém? Esperamos uns vinte minutos, e tentamos de novo. Pegou. As montanhas ali são as Bighorn, o primeiro sinal das Montanhas Rochosas. Um pouco mais ao norte, fica a Little Bighorn, onde o Sitting Bull acabou com o Custer e a Sétima Cavalaria (uma vitória que se tornou uma derrota. Depois da batalha, o governo dos EUA aplicou TODAS as forças para acabar com os índios. General Sherman tinha uma agenda muito clara: acabem com os búfalos e os índios desaparecem.)

Com o carro respondendo bem só de vez em quando, passamos por uma estrada fabulosa, com rochedos, deserto, e pedras de cores incríveis. Um cervo aqui e ali, saltando com aquela elegância característica. As decidas eram feitas em neutro (ou ponto morto: Gilda é hidramática) para esfriar o motor.

Chegamos finalmente a Cody. Cody é praticamente a última cidade antes de Yellowstone, e foi fundada por William S. Cody, o Buffalo Bill. A cidade é uma versão comercial de uma cidade do Wild West, mas afinal de contas, era isto que o Buffalo Bill queria. Ele passou os trinta anos em uma caravana com seu circo sobre o Wild West, encenado ataques a diligências, ataques de índios, ataques a bancos, e tudo mais. Chapéus de cowboy a 40 dólares, mocassins indígenas a 240 dólares.

Qualquer um pode ser Wyatt Earp (spelling?).

O que foi legal em Cody (o motel era uma droga) foi o museu Buffalo Bill, com uma seção inteira sobre a cultura dos índios dos Great Plains (principalmente Crow e Sioux). Os trabalhos de bordados nos vestidos eram fabulosos, com espinhos de porco-espinho ou miçangas de cerâmica, pedras, conchas. Eles usavam muito aquele azul celeste, que os nossos índios também gostavam. Faziam absolutamente tudo com o búfalo, das casas aos instrumentos cortantes feitos de osso. Ao mesmo tempo se adaptavam muito bem aos novos materiais trazidos pelos europeus: facas, panelas, rifles e as próprias miçangas coloridas de vidro (a gente tem mania de pensar nas culturas como sendo estáticas, imutáveis). Era interessante ver uma faca, fabricada em Dresden, Alemanha, com uma bainha toda bordada com símbolos Sioux.

Mas o grande barato do Wyoming é Yellowstone.

Chegamos no parque no dia seguinte (já marcando 3.000 milhas!), armamos a barraca e, enquanto o Roberto descansava, eu fui cumprir o meu dever de turista e pegar todos os mapas que podia no Visitor Center. Recebemos as maiores recomendações sobre como evitar os ursos (Yellowstone é um dos poucos parques em que eles são preservados).

Qualquer coisa com cheiro tem que ser guardada dentro do carro. Eu tive que renunciar ao meu repelente Autan. O cheiro é tão forte que eu seria uma isca de urso ambulante. Os melhores horários para observar animais são de manhã (antes das 8) e à noitinha (depois das 7), então todas as manhãs por volta das seis eu começava uma campanha para acordar o Roberto, e circular pelo parque.

Infelizmente (ou felizmente), nem sinal de ursos.

Muitos bisões. Muitos. Sempre. No meio das estradas, nos vales, nas trilhas. Alguns elk (um tipo de cervo, acho, ou algo entre um alce e um cervo), coiotes, cervos (estando no fim do verão, vimos vários filhotes com as mães, seja de cervos, elk ou bisões. Meus favoritos são, obviamente, os "bambis"), pássaros e bilhões de esquilos, já preparando para o inverno. Como correm os danados! Mas o ponto máximo foi a bald eagle, ou águia de cabeça branca. Lá estava ela, tão americana como torta de maçã, a beira de um riacho. É enorme, grande como uma das nossas harpias. Normalmente nós temos a imagem da águia voando, e não há nada próximo que dê uma idéia do tamanho, proporção. Desta vez a águia estava ao lado de um trono enorme, às margens do córrego, e foi impressionante.

Yellowstone tem ainda as marcas do incêndio de 1988, quando quase 36% do parque foi queimado. É triste ver colinas e colinas com troncos secos, mortos mas ainda em pé. Até 2008, todos estes troncos devem cair. Ao mesmo tempo, se olharmos mais atentamente, pode-se ver que ao pé destes troncos, há um mar de pequenos pinheiros, de uns dez anos de idade. Acontece que as sementes daqueles pinheiros só germinam quando expostas a altas temperaturas (como no incêndio). O fogo, de fato, permitiu a renovação do parque. Fogo é tão parte da natureza como chuva, ainda que nós tenhamos dificuldade em entender isto (o que não quer dizer que a gente tenha que sair por aí dando fogo em florestas).

Sábado de manhã resolvemos sair das estradas principais e dar um longo passeio pelas trilhas internas. Com todas as precauções contra os ursos.

Aí se tem uma real idéia do parque, sem os carros, os barulhos humanos. Cervos passaram bem próximos a nós, e esquilos, e patos. Num momento estávamos em um lago, com lírios e uma floresta; no outro momento estávamos em uma paisagem lunar, com fontes de água sulfúrea. Não dá para descrever (vejam as fotos). Yellowstone fica numa antiga cratera e tem uma composição geológica muito peculiar. Por conta disso tem a maior concentração de géiseres do mundo. E isto em nada perturba os habitantes não-humanos da região. Em Mammoth Hot Springs, vimos uma família inteira de proghorns calmamente descansando ao lado das fontes termais (seres humanos não podem chegar perto das fontes, pois o terreno pode ceder. De fato, alguns geólogos já voltaram bem queimados de suas explorações). Suponho que no inverno, quando tudo fica coberto de neve, seja um alívio.

Passamos pelo Yellowstone Canyon, e vimos as enormes cascatas. Água verde, acho que por causa da composição química. Na verdade o Canyon todo tem cores incríveis, vermelho, puro branco, amarelo, por causa da presença de enxofre (e outros elementos que eu não lembro). Caminhamos por alguns quilômetros na beira do canyon, um total de quatro horas de hiking para dois viciados em computador cujo principal exercício nos últimos seis meses tinha sido mover o mouse. À tarde estávamos praticamente em estado de coma.

Ficamos em Yellowstone por três dias. Exploramos o parque a pé, a cavalo (primeira vez que Roberto montava na vida; ao menos por alguns dias ele não vai esquecer a experiência), e de carro (quase 150 milhas só dentro do parque). E francamente, não deu nem para o começo. Os ursos ainda estão me devendo. Mas as férias estão acabando.

Próxima parada: Idaho!

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