Phase IX - South Dakota e as Black Hills
Como sempre, bem atrasada no meu programa, porque o Roberto monopoliza o computador.
Deixei vocês no Nebraska. Um estado fabuloso, nesta altura já tínhamos 2000 milhas (estou com preguiça de fazer a conta para quilômetros). De Nebraska fomos para o Norte, South Dakota, através da reserva indígena de Pine Ridge, uma reserva Sioux. Ali ocorreu o massacre de Wounded Knee, onde a cavalaria americana trucidou 250 Sioux, incluindo mulheres e crianças. Embora não seja o pior massacre da história dos índios na América (vejam Sand Creek, Bear Creek e uma lista de outros), Wounded Knee foi logo depois de um tratado, e foi transformado em símbolo em 1972 por grupos indígenas modernos para negociar melhores condições de tratamento com o governo americano. Não vimos um marco no local. Em compensação, havia (próximo) um painel sobre o chefe Sioux Crazy Horse, que é considerado um dos mais importantes líderes Sioux no período das guerras Índias. Foi morto a traição em um forte próximo a Pine Ridge.
Seguindo pela reserva, nós tivemos a primeira visão do "Muro" (the Wall).O Parque Nacional das Badlands. Acho que já comentei que toda esta parte central do Estados Unidos, que é plana, fazia parte de um imenso mar salgado, do qual só a Baia de Hudson sobrou. O mar recuou levando toda areia "mole". Mas a areia que era mais "dura" (sandstone) sobrou nestas imensas montanhas, brancas, com linhas de sedimentos que contam a história geológica da área. São imensas, fantasmagóricas, puras esculturas de areia. Custer chamou as Badlands de "inferno sem fogo". Mas eles são lindas, não parecem com nada que eu já tenha visto na vida. Ficamos quase toda a tarde nas Badlands, com uma pequena passada na Walldrug, a capital kitsch dos Estados Unidos (acho que só perde para Las Vegas). Era uma pequena drugstore na cidade de Wall, South Dakota, ou seja, no meio do nada. Estava indo a falência na grande depressão quando a proprietária teve a idéia de colocar cartazes na estrada, oferecendo gelo grátis. E as pessoas começaram a parar. Hoje eles vendem de tudo, o lugar vive em torno da drugstore (acho que só não vendem remédios), e colocaram cartazes a cada quinhentos metros na highway, anunciando de Godzilla a chá gelado. Marketing em South Dakota.
Dormimos em Rapid City (uma vergonha, um dia inteiro na estrada e não avançamos mais que algumas milhas para oeste) e no dia seguinte fomos para o Mount Rushmore. Lá estão esculpidas as faces de quatro presidentes: Washington, Jefferson, Roosevelt e Lincoln. Era pra ser meio busto, mas o escultor morreu antes. E só o rosto já custou alguns milhões de dólares e ao menos uma década de trabalho. É impressionante, mas bem comercial. Tem um gosto amargo para os índios, uma vez que o Mount Rushmore fica nas Black Hills, uma área sagrada para os Sioux, e causa de muitas guerras e tratados quebrados. Mais para "dar o troco", fomos visitar também a escultura do perfil de Crazy Horse, em uma montanha próxima. Já estão trabalhando nela há mais de 50 anos, e ao menos o rosto ficou pronto. O escultor morreu, mas neste caso a esposa e os filhos estão continuando a obra. Como não é uma obra do governo, mas de um organização não governamental, os recursos são poucos e a obra ainda deve demorar.
Depois fomos para o coração das Black Hills, o Custer National Park. Não deixa de ser insultante que o parque nacional nas Black Hills tenha recebido o nome de Custer, que foi responsável pela perda daquela área para os índios. Custer liderou uma expedição em busca de ouro nas Black Hills, cuja posse para os índios já fora assegurada em meia dúzia de tratados. Depois que se confirmou a presença de ouro, não havia como deter a invasão da área por colonos. As montanhas têm este nome porque a floresta de pinheiros, muito fechada, parece negra de longe. O parque é fabuloso, e parece bem com o que imaginávamos das Black Hills. Na verdade, o Nebraska e South Dakota são exatamente como nos filmes de caubói. Nem uma casa por milhas e milhas, as montanhas ao fundo, nada plantado, os arbustos aqui e ali, e as colinas. Atrás de cada colina pode-se esconder uma manada inteira de bisões, ou um exército, e antes de passá-la nem se nota. Lugares perfeitos para emboscadas. (A noite, em Rapid City, vimos no Motel um festival de filmes de John Wayne, e juro que me parecia reconhecer as montanhas.) Dirigimos quase cem milhas dentro do parque e só vimos um pedaço pequeno. Vimos aqueles cabritos monteses, os bighorn, os prairie dog, esquilos, cervos de todo o tipo. Mas é um tipo de visita naturalista típica daqui: você não sai do carro. Óbvio, se nós tivéssemos mais tempo, poderíamos acampar e depois subir as colinas via hiking. Mas o parque é tão imenso, que se não for de carro não se tem a mais pálida idéia do que está acontecendo. Além de ser imenso, é muito diversificado. Onde tem o cabrito montês, não tem bisão, e onde tem bisão não tem águia. O melhor seria percorrer tudo a cavalo. Ou se resignar à impossibilidade de fazer tudo o que se quer.
Já estava tarde e eu estava bem decepcionada porque não tínhamos ainda visto o búfalo (o parque tem uma das maiores manadas remanescentes). Decidimos entrar por uma estrada meio lateral (seguindo uma fila de carros que seguia um ranger, nos metemos ali sem dizer nada), e a cada colina esperávamos encontrar o búfalo. De repente ao longe uma mancha preta. Milhões de fotos, ohs! e ahs! Um pouco mais pra frente, uma mãe com o filhote. Mais ohs! e ah! De repente nos vimos CERCADOS de búfalo por todos os lados. De todos os tamanhos e sexos. Fêmeas, machos, filhotes, caminhando no meio da estrada com a maior sem-cerimônia. A pobre Gilda (nosso carro) parecia totalmente perdida ali no meio. E de vez em quando um dos machos começava a brigar com outro, e quem se atrevia a tocar a buzina? Esperamos até que eles pachorramente resolvessem se mexer. Apenas escapamos de uma manada, já nós encontramos em outra. Basta de búfalo!
Deixamos o parque e chegamos em Gillette, Wyoming a noite. Primeira refeição digna de nota: um grande steak em um restaurante mexicano.
Amanhã: Yellowstone
|